Pense comigo. Dois irmãos, que, após a morte da mãe, são chutados de casa pelo padastro. Sem dinheiro, eles vão para Tokyo onde conhecem Shigeru Ito, um garoto de rua trambiqueiro que lhes apresenta algumas maneiras ilegais, estranhas e imorais de financiar suas despesas de vida. Okay, até aqui você pode pensar que se trata de uma história melo-dramática com mensagens reflexivas, mas não. Aqui está o pontapé inicial para uma comédia extremamente inusitada e divertida. Bem vindos ao mundo de Boku to Issho.
Criado no ano de 1997 e finalizado no ano seguinte (Young Magazine), Boku to Issho é um mangá seinen de comédia com apenas 4 volumes, de autoria de Minoru Furuya - bastante conhecido por Ping Pong Club (1993) e Ciguatera (2003). Minoru teve como marca registrada os seus trabalhos de comédia, mas com um foco bastante realista. Já explorou temas como pressão, desesperança e futilidade da vida moderna. Em seus personagens sempre houve uma evidência clara associada aos que vivem em um capitalismo japonês extremo. Entretanto, o que o diferencia de muitos, é o seu humor perante essas dificuldades do dia-a dia, e por conta disso muitas histórias convincentes e interessantes vieram a tona nos anos 90 , que foi o seu grande auge no gênero humor. Um reconhecimento veio quando ganhou o prêmio Kodansha Manga Awards pelo seu primeiro trabalho (Ping Pong Club). Mas, esse padrão construído logo foi quebrado com o surgimento do mangá Himuzu em 2001, que foi substancialmente diferente de todos os seus trabalhos anteriores até então. Ao invés de um mangá de comédia , a história tem como foco o psicológico dos personagens e o modo como lidavam com diversas situações estressantes. Alguns fãs acolheram bem essa mudança brusca, outros simplesmente odiaram. Com o fim de Wanitokagegisu em 2007, Minoru anunciou um novo começo em sua carreira dizendo voltar com os mangás de comédia.
Enquanto esperamos sentados essa volta do Minoru, hoje vou resenhar o seu segundo trabalho. Como eu disse já no início, Boku to Issho é um mangá que visa muito mostrar o humor ''negro'' de situações extremas, no entanto, o que daí poderia sair algo contraditório, se torna algo completamente convincente em sua mensagem principal, bem como em seu humor exacerbado. Todos os personagens em sua maioria possui expressões faciais impagáveis e as situações caóticas extrai de cada um diversas reações ilarias.
Uma coisa que chama muito a atenção, de fato, é a arte do mangá. Na verdade o enredo não chega a ser grande coisa, mas a criatividade que o autor coloca perante tais situações é o que abrilhanta todo o resto. O humor não está somente no cotidiano sofrido dos rapazes, como também está em suas expressões. Esse designer caricato é bastante próprio e ajuda a história a ganhar consistência e credibilidade em questão de segundo. E o que poderia se tornar em uma característica massante e cansativa, na realidade, é justamente ao contrário. Se for pra parar pra pensar, tudo em Boku to Issho é ao contrário. Qualquer detalhezinho é mostrado exageradamente. Parece que os personagens sempre estão em seu máximo. Gritos são constantes, berros desnecessários fazem a festa em quase praticamente todo capítulo. E isso para mim é o legal dos personagens. O autor arrancou uma característica que todo adolescente tem, ou todo adulto um dia em seu passado teve. Todo mundo é, ou já foi exagerado. Todo mundo já tirou um sarrinho daquele seu amigo noia, ou certinho. Não que seja por maldade, mas por estar tão intimo da pessoa que você automaticamente faz tudo o que der na cabeça. Pois é, os três personagens principais aqui, botam pra fora tudo, absolutamente tudo o que pensam. Uma vez ou outra aparece um balão de pensamento, porém, em sua grande maioria todos os balões estão em exclamação.
Digo e repito: por incrível que pareça, isso não chega a ser irritante. É o oposto. É hilário. Ler Boku to Issho é o mesmo que estar acompanhado daquele seu amigo sem noção, só que ainda mais cheirado que um cara da cracolândia. Pra quem não gosta desse tipo de gênero, cai fora, Boku to Issho não é pra você. Pois o mangá quebra regras com uma facilidade enorme, e distrói qualquer pingo de sentimentalismo que por ventura possa aparecer, com naturalidade. Como se fosse a coisa mais normal do mundo. Acho que ai entra a questão pessoal de cada um, uma vez que abandonados, agem por conta própria que influencia muito na hora de compor suas próprias regras de vida, e nem percebem o quão distante estão de uma pessoa que possui princípios morais do que pode e do não pode fazer.
Eu não sei se a pessoa não precisa ter escrúpulo nenhum para rir das piadas, mas eu particularmente, considero os diálogos muito divertidos. Não chega a ser forçado porque ta naquele quesito de ser exagerado por nascença, então qualquer cena que o autor tenha dado uma forçada na barra, pode passar totalmente despercebido. E isso é muito bom, a arte do mangá também contribui bastante com o que está sendo dito em cada momento. Os cenários estão o mais normal/realista possível, e incrivelmente bem detalhado em alguns quadros, lembrando sempre que os personagens são o centro das atenções dentro daquele universo. Já em outras ocasiões o autor só coloca um fundo branco ou um fundo preto por trás que já tudo resolvido.
Bom, eu não quero me aprofundar muito no que vem depois, e nem entrar em maiores detalhes sobre a história, pois essa resenha tem só como objetivo de aguçar a sua vontade de conhecer mais sobre, caso você goste desse tipo de gênero. Porém, posso garantir que é um prato cheio para quem gosta deste tipo de humor, assim como eu. Vão na fé.
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